Vocês já devem ter percebido que eu
tenho um certo encantamento excessivo por pessoas que transitam entre duas
carreiras ou que já fizeram a complicada migração entre duas ou mais áreas.
Vide minha entrevista com a Matilda Temperley sobre o tema.
Um elemento que de cara me chama a
atenção dentro desse universo fluido de desejosos e ansiedades profissionais e
pessoais se chama generosidade. Sim, isso mesmo que vocês leram. Generosidade com
quem está começando, com quem está aprendendo, com quem precisa de ajuda e de
carinho. Carinho mesmo, porque não?
Eu tenho alguma pouca sorte nesse
quesito e já vivenciei um tiquinho dessa generosidade, talvez uma resposta
cósmica ao fato de sempre ter sido generosa com quem me pede conselhos ou
alguma ajuda na minha área*. Vez em quando recebo carinho em forma de
generosidade de algumas pessoas dentro dessa área na qual estou a me embrenhar
há alguns meses: a moda e seus afins. Em uma entrevista a Garance Doré, Nina Garcia, diretoracriativa da Marie Claire (entre outras tantas coisas) disse algo super
revelador, porém um tanto óbvio sobre generosidade profissional: ‘I love to
mentor young talent’ [eu amo aconselhar, treinar jovens talentos’]. Nina faz
referência aos jovens editores que ela ama descobrir e colocar a seu lado no
trabalho, algo que, segundo ela, traz frescor e inovação não só à revista, mas
ao próprio trabalho dela. ISSO, meus amigos queridos, se chama generosidade
profissional – com altas pitadas de empreendimento e interesse pessoal também, claro, isso também é preciso e faz parte do processo, tudo são interesses e isso não é necessariamente ruim, ok?
Eu sinto muita falta disso, não só
nesse meio doido e tão “aberto” que é o universo da moda e da plasticidade, mas
também no meu próprio meio de partida, o meio acadêmico. A generosidade de
profissionais já estabilizados, que podem não só aconselhar, mas abraçar jovens
talentos e profissionais que tem tanto desejo e força de vontade de crescer e que
só podem acrescentar ao que já esta estabelecido numa revista, numa redação,
num departamento acadêmico, num blog, numa plataforma de informações, num
balcão de loja, etc.
Eu ainda – sim – fico boquiaberta
com a falta de carinho e generosidade que vejo e vivencio cotidianamente em
vários segmentos; me impressiona como as pessoas esquecem como é começar, como
é não ter o nome ainda ressonante numa dada área, num determinado nicho. Como é
difícil o começar do zero... Não confundam isso tudo que estou abrindo com
inocência ou tolice, eu sei diferenciar generosidade do interesse negativo (aquele que machuca) e não sou tão
bobamente romântica e iludida com as coisas como pode parecer. Aliás, ilusão,
um tema complicado. Me refiro apenas ao fato das pessoas alcançarem seus
sonhos, desejosos, os ‘goals’ (amo esse termo) e abstraírem do caminho todo que
percorreram e de todas as mãos que foram importantes pra elas chegarem até lá –
seja o 'lá' onde for.
Eu sempre lembro desse tema quando
dou aulas aos meus graduandos, sempre mostro a eles que, assim como eles,
eu já estive ali, sentadinha, escondida e não faz muito tempo. Eu também fui
aluna e ainda sou, felizmente! Aprender é um ato aberto e contínuo.
Acho que não preciso dizer mais,
preciso? Boa semana a todos!
‘There are times when a critic truly risks
something and that is in the discovery and defence of the new. The world is
often unkind to new talent, new creations, the new needs friends’, Anton Ego
(Ratatouille, 2007)
* Acho que nunca especifiquei minha área de atuação por aqui, né? Eu sou doutoranda em Medieval Studies pelo King’s College London (Inglaterra). Trabalho com materialidades aristocráticas insulares, basicamente transito entre História e Literatura. Desde janeiro de 2013 dou aulas pra alunos
do primeiro ano de graduação em English
Studies.
Gabi, lendo o seu texto me lembrei de outras questões - até mais "graves" dependendo do ponto de vista - fiz diversos cursos na área de moda, onde paguei muito caro para um especialista me ensinar a essência de uma modelagem perfeita ou algo mais profundo sobre estamparia. Sabe o que eu recebi em troca do dinheiro que paguei? Nada além do que qualquer curso básico poderia me ensinar, somente a presenta do "ilustre" professor. Depois de conversar com diversas pessoas, percebi que todos chegaram a mesma conclusão. Mesmo os professores - estilistas beeem famosos - não estão dispostos a passar seu conhecimento nem pelo dinheiro que pagamos a eles. Sei que um dele é um mestre em modelagem, faz coisas incríveis, mas nos transmitiu somente os conhecimentos básicos, mesmo que os outros tenham sido solicitados. Vejo certo egoísmo onde me parece que esses "professores" vão levar seu conhecimento para o túmulo sem transmiti-los. Ironia? Falta de respeito? Não sei nem como classificar!
ReplyDeleteBeijos!
Adorei seu comentario, Amanda! E super concordo pela experiencia que tive, nao na area de moda, claro, mas no meu nicho academico. Cansei e canso de ver professor e profissional guardar temas de pesquisa e conhecimento a sete chaves como se fosse um tesouro, mas daqueles mesquinhos, sabe? Conhecimento nao se guarda em prateleira ou na memoria falida, conhecimento deve ser dividido!
ReplyDeleteE digo mais, eu tenho muita experiencia no trato com professores brasileiros, europeus e norte americanos, sao 7 anos de academia, e digo pela minha experiencia pessoal: nenhum lugar me assusta tanto pelo egoismo didatico e preciosismo tolo do conhecimento adquirido do que o Brasil. Digo isso com muita tristeza e decepcao. Mas foi o que vivenciei e continuo vendo.
Beijo e obrigada pela leitura! ;) Vale muito esse feedback!